Meu terceiro dia em La Paz foi uma saga para resolver algumas coisas práticas. Eu precisava sacar dinheiro, comprar a passagem para Copacabana e decidir como faria para voltar para Santa Cruz de la Sierra. Acordei, comi uma empanada e parti para minha missão.
Meu primeiro destino foi a rodoviária, que fica bem próxima do hostel. Lá tive meu primeiro susto: havia uma protesto em El Alto, e os moradores estavam bloqueando a passagem enquanto o governo não oferecesse garantias de que agilizaria a construção de uma estrada melhor para a região. A primeira companhia disse nem vender o bilhete, enquanto a segunda disse que havia um “caminho alternativo”. Não botei fé e resolvi deixar para comprar a passagem depois.
Segundo problema: nenhum caixa eletrônico me permitia sacar dinheiro. Desesperado, resolvi ir direto a uma agência do Banco do Brasil na cidade (Av. 20 de Octobre). Para isso aproveitei para conhecer o centro da cidade. La Paz tem prédios grandes, correria e multidões caminhando como em qualquer grande centro.
Minha primeira surpresa foi encontrar uma espécie de barraco na frente do Ministério da Justiça. Na fachada frases sobre a ditadura militar na Bolívia. Entrei e encontrei dois senhores idosos, que conversaram comigo sobre o porque estavam ali. Eles eram vítimas da Ditadura militar de Hugo Banzer, e estão ali na frente a 1342 dias esperando que o Ministério da Justiça indenize as vítimas da repressão. Falei que no Brasil havíamos instaurado uma comissão da verdade, que não tem poder de punição por causa da lei da anistia, mas que estava fazendo um resgate histórico dos crimes contra a humanidade realizados em nosso país, e que várias pessoas foram indenizadas. Eles disseram que estamos muito a frente nesse debate e lamentaram a falta de vontade politica do governo Evo, que segundo eles não moveu uma palha nesse aspecto.
Depois eles me mostraram alguns computadores que foram queimados em um atentado feito contra eles em 2014, quando segundo eles guardas do ministério da justiça atearam fogo no barraca durante a madrugada. Também mostraram fotos de uma senhora, também vítima da ditadura, ferida durante outro atentado em 2013. Assinei o abaixo assinado e sai de lá emocionado, lembrando de quantas atrocidades foram cometidas na América Latina por essas ditaduras sanguinárias do Plano Condor, cujos reflexos nefastos sentimos até os dias de hoje.
Fotos da barraca de vigília das vitimas da ditadura militar Boliviana
Caminhei um tanto em direção a um parque que havia ali por perto para esfriar a cabeça. O parque era bem grande e bonito, repleto de árvores, brinquedos para crianças, ciclovias e passarelas. Haviam algumas pessoas passeando, casais namorando (os Bolivianos são muito românticos) e crianças brincando. A vista da passarela também era bem bonita, de longe dava para ver uma ponte que ligava duas áreas da cidade.
Diferentes vistas do Parque Central
Passeando mais um pouco cheguei até uma espécie de praça, chamada Camacho. Por lá havia alguma infraestrutura, como lojas e centros de atendimento para a população. Mas o que mais me chamou a atenção foram os grafites e murais que estavam pintados nos muros.
Grafites no centro
Eu já estava meio de saco cheio de caminhar, então peguei uma van que me deixou na rua do Banco do Brasil. Parecia um bairro nobre, as pessoas eram mais brancas, usavam terno e gravata e dirigiam carros importados. Uma coisa que me chamou a atenção foi um casarão todo grafitado, que destoava totalmente da paisagem de concreto. Era um casarão ocupado por um coletivo anarco-feminista chamado Mujeres Creando, pois haviam várias mensagens do gênero dentro e fora do lugar, assim como livros para vender. Infelizmente o lugar estava em reforma.
Fotos do Casarão Feminista do coletivo Mujeres Creando
Saindo dali fui direto ao Banco do Brasil, que fica em um imenso edifício todo espelhado em vidro azul. Lá finalmente consegui sacar o dinheiro, além de descobrir a origem do problema: minha conta estava em aplicação automática, logo não havia saldo em conta. Um tanto puto comigo mesmo fui almoçar ali perto, em um típico almoço executivo. Depois voltei para o hostel para descansar um pouco e decidir meus próximos passos. Antes disso passei na antiga igreja de São Francisco para tirar algumas fotos.
Na praça da igreja
Igreja de São Francisco
Chegando no hostel pesquisei o preço das passagens de avião e achei uma “até que em conta” para Santa Cruz. Como eu havia escutado que as estradas que ligam Cochabamba até Santa Cruz estavam com problemas, me pareceu uma boa tentar um plano B. Não me culpe, meus relatos de viagens de ônibus pela Bolívia não foram dos melhores! Para comemorar ainda tirei umas fotos do monte Illimani da janela do Hostel.
Vista do monte Illimani
Com a passagem comprada, jantei e fui até a zona sul da cidade, onde eu havia combinado de me encontrar com uma amiga boliviana. Depois de todo caos do congestionamento consegui chegar até o local, e fomos beber em um pub próximo a um shopping center. Sim, pub e shopping center, a zona sul de La Paz é totalmente diferente do centro e de El Alto, muito mais rica e parecida com qualquer outra cidade “globalizada e pasteurizada”.
Conversamos bastante e depois pegamos um ônibus para o bairro dela, onde peguei um Táxi até o hostel. Conversei com o taxista que me convenceu que era “tranquilo” ir até Copacabana no outro dia, pois haviam vários caminhos alternativos, e que o esquema era pegar o ônibus direto no Cemitério de La Paz.
Na chegada no hostel ainda tive pique para tomar umas cervejas no bar junto com os amigos Argentinos e Brasileiros, e jogar umas partidas de sinuca com os hermanos.
Gastos (em Bolivianos)
- 16 café (~R$ 9,42)
- 55 hostel (~R$32,35)
- 5 limpeza do tênis (~R$ 2,94)
- 5 pasta de dentes (~R$ 2,94)
- 20 almoço (~R$ 11,76)
- 3 ônibus (~R$ 1,76)
- 33 janta (~R$ 19,41)
- 45 drinks (~R$ 26,47)
- 25 táxi (~R$ 14,70)
- 20 cervejas (~R$ 11,76)
- Total: 227 bolivianos (~R$ 133,52 na cotação de 1,70).
Passagem para Santa Cruz de la Sierra: 537 bolivianos (~R$ 316 + taxas do cartão).