Dia 01/01, terceiro dia no deserto, ressaca, gêiseres e a viagem para La Paz

Bom, não preciso dizer que acordei com uma ressaca desgraçada. Chá de coca não faz milagre, então passei a manhã toda meio enjoado ainda mais porque o trajeto até os gêiseres não era dos mais regulares.

Os gêiseres foram a primeira parada. A paisagem faz você pensar que está em outro planeta, com um vale desértico cercado por montanhas de pedra que parecem que foram empilhadas por pessoas. O cheiro é de enxofre e existem umas poças de um fluído que lembra lava e fica borbulhando. Os  gêiseres são um barato e dá pra brincar de pular por cima deles (sentir aquele jato de vapor quente na bunda é meio apavorante). Não preciso dizer que pular por cima dos gêiseres de ressaca não é uma boa ideia.

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Os gêiseres

Partimos dos gêiseres direto para as águas termais. Um lago de águas quentes, aquecidas pela atividade vulcânica da região. É permitido entrar na água, desde que você pague a taxa necessária. Eu ainda estava meio mal, então não me empolguei muito. Fiquei sem poder tirar fotos depois dos gêiseres, pois a bateria do celular havia acabado na noite anterior (havia quase uma “guerra da tomada” de várias pessoas que lutavam por esse escasso recurso de nosso alojamento).

A próxima parada foi a laguna verde, próxima da fronteira com o Chile. A laguna não tem vida, pois suas águas são excessivamente sulfurosas, o que ao mesmo tempo lhe confere uma cor esverdeada que muda ao longo do dia. Além disso a lagoa fica de frente para o majestoso vulcão Licanbur, que tem quase 6.000 metros de altitude.

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Licanbur e a laguna verde (foto da Wikipédia)

Depois do Vulcão partimos para a fronteira com o Chile, onde a Suiça e o Alemão iriam pegar uma van direto para San Pedro de Atacama, no Chile. Nos despedimos e seguimos viagem. Estávamos começando a ficar com fome, então entrou em cena aquele personagem que havia sido esquecido desde o inicio da viagem: O amendoim japonês, que fez um tremendo sucesso com a galera e que ainda seria aproveitado em outro momento da viagem.

O resto da viagem foi bem tranquilo e não tivemos mais muitas paradas interessantes. Paramos para almoçar em um vilarejo e depois paramos em outro pueblo para lanchar já no final da tarde. Haviam várias pessoas trabalhando no mercado público e outras bem bêbadas em uma festa de ano novo interminável. Um sujeito quis trocar seu chapéu pelo meu mas neguei com veemência.

Foi então que chegamos em Uiuny no inicio da noite. Eu, o outro Pablo e Daniel nos despedimos de Ernesto e dos demais e partimos em busca de uma boa janta e uma tomada para carregar nossos celulares. Conseguimos encontrar uma pizzaria e ficamos um tempão trocando ideias. Depois partimos para a parada dos ônibus onde eu iria pegar minha condução para Oruro e depois para La Paz.

Mostrei meu bilhete para a senhora da agência que me disse para esperar e depois falou algo que na hora não compreendi muito bem, mas achei que não era importante. Fiquei esperando e nada. Quando havia passado o horário do ônibus voltei na agência e perguntei se havia ocorrido algum atraso. Fui pego de surpresa quando ela disse “Seu ônibus já saiu, a companhia mudou, não é essa do bilhete”. Fiquei desesperado, me despedi na corrida de Pablo e Daniel e sai em busca de um Táxi. Peguei o primeiro que vi e falei para ele pisar fundo em busca do ônibus, que havia saído a cerca de 10 minutos. Adrenalina a mil conseguimos pegar o ônibus no caminho. Até agora não sei se o Taxista me deu o troco certo, mas pelo menos consegui entrar no ônibus e partir para Oruro aliviado.

A estrada era boa, uma das melhores da Bolívia. Chegando em Oruro fiquei meio desesperado pois a rodoviária estava fechada e eu tinha que pegar outro ônibus para La Paz. Mas tudo se dá um jeito na Bolívia, haviam várias pessoas vendendo passagens no meio da rua, em plena madrugada. Peguei o primeiro ônibus que consegui e parti rumo a La Paz, próximo capitulo deste blog.

As fotos da viagem pelo deserto e salar podem ser vistas aqui.

Gastos (em Bolivianos)

  • 50 janta (~R$ 29,00)
  • 5 banheiro (~R$3)
  • 60 ônibus para Oruro (~R$ 35,00)
  • 25 ônibus para La Paz (~R$ 14,70)
  • 50 táxi para perseguir o ônibus (~R$ 29,00)

Total: 190 bolivianos (~R$ 112 na cotação de 1,70).

Dia 31/12, segundo dia em Uyuni, o deserto, as lagoas e o ano novo

Acordamos e por volta das 7 da matina partimos pelo deserto. No caminho passamos por várias roças que Ernesto disse serem de Quinoa,  o nutritivo grão tão caro no Brasil é uma comida bem popular na região andina.  No caminho a gente ia revesando quem sentava na frente ao lado de Ernesto. Cada pessoa que ia na frente acabava puxando um papo diferente: música, futebol, politica, cultura em geral. Foi uma baita troca de experiências.

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Rumo ao segundo dia de passeio pelo deserto!

Depois de um tempo paramos em um mercado de um pequeno vilarejo para a galera comprar bebidas para a festa de ano novo. É bem interessante notar a estrutura que esses pequenos vilarejos tem, com postos de saúde, escolas novas, ginásios de esportes e sistemas de abastecimento de água (o programa “mais água” do governo federal deles), sempre acompanhados das plaquinhas com a foto do Evo.

Em seguida viajamos mais algumas horas até a próxima parada, sempre acompanhados da trilha sonora escolhida por Ernesto que tentava agradar a todos os públicos do carro. Começou com música Brasileira: o forró de Robério e seus Teclados (que para mim era novidade), passando para clássicos como Morango do Nordeste, Toque toque meu bem e a época de ouro de Chitãozinho e Chororó. Depois colocou música caribenha para tentar agradar os Costa-riquenhos (que reclamaram que lá não é Caribe, mas sim América Central) e Cumbia e Reggaeton para os Argentinos. Não deu muito certo, mas estava divertido e um tanto surreal.

Dj Ernesto – Robério e seus teclados

Dj Ernesto – Morango do Nordeste

A primeira parada para passeio foi em um vale com rochas esculpidas pelo tempo com o belo vulcão Ollagüe ao fundo. Ficamos por ali por uns 20 minutos e depois partimos para a primeira lagoa, que estava um tanto seca pela falta de chuvas. A lagoa Cañapa tinha um cheiro de enxofre, mas mesmo assim tinha muita vida. Vários flamingos, insetos e passarinhos viviam ali.

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Vulcão Ollagüe que fica na fronteira do Chile com a Bolívia

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Pedras esculpidas pelo vento

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Lagoa Cañapa

Já estávamos com fome, então a próxima parada foi para almoçar ao lado da lagoa Hedionda (o cheiro era hediondo). O rango foi simples porém gostoso, batatas (para variar), macarrão, carne, maionese e salada. Pelo que entendi os motoristas dos passeios levam tudo semipronto e só esquentam nos locais onde paramos.

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Proibido voar na Laguna Hedionda!

A próxima parada foi a laguna Ramaditas. Nessa lagoa não havia tanta vida como nas outras. De lá partimos para o Deserto Siloli, um dos mais áridos do mundo. A primeira parada no deserto foi na famosa árvore de pedra, onde existe uma formação rochosa que lembra uma árvore e um vento de matar. Achei bem parecido com Vila Velha, em Ponta Grossa no Paraná. O mais bacana foi encontrar um coelho Viscacha em cima de rochas próximas, imóvel e camuflado.

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Laguna Ramaditas

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Coelho nas rochas

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A árvore de pedra

 Para fechar os passeios do dia seguimos para o Parque Nacional Eduardo Avaroa, onde está a famosa Laguna Colorada. Ernesto tinha um plano: estávamos em 7 pessoas, mas o normal é estarem em 6 no carro. A ideia era que alguém ficasse escondido e não pagasse os 150 bolivianos da entrada (cerca de 90 reais). O dinheiro economizado seria empregado em bebidas para a coletividade. Fui o escolhido, e fiquei escondido no meio dos bancos até a gente passar pelos guardas do parque. Respirei aliviado quando passamos.

A Laguna Colorada é linda. A cereja do bolo do passeio do segundo dia. Ela é enorme, e o verde, vermelho e branco se misturam e uma paisagem quase lunar. Diversos tipos de Flamingos, como o Flamingo Chileno e o Flamingo Andino vivem ali.

20151231_165446 20151231_170544Laguna Colorada

Já bem cansados partimos no final de tarde para o alojamento onde iriamos passar a virada do ano. Na janta comemos um macarrão que estava muito bom e começamos a beber vinho para comemorar. O vinho Kohlberg seco era o mais bacana, mas tinha um mais barato (15 bolivianos de diferença, nem 10 reais!) que compramos que parecia suco de uva com MUITO açúcar. Era horrível. Já meio alegre fui na vendinha e consegui negociar a troca de uma garrafa daquele vinho bizarro por outro Kohlberg (pagando alguns bolivianos a mais), aproveitei e comprei luvas porque estava realmente muito frio.

Uma das coisas mais espetaculares que vi na viagem foi o céu estrelado no meio do deserto. A quase ausência de luz artificial nos arredores te faz ver muitas, mas muitas estrelas. É algo fascinante. Não é a toa que o maior observatório astronômico do mundo fica localizado no deserto de Atacama, bem próximo de onde estávamos.

O resto da noite foi bem divertido. Brindamos várias vezes o ano novo, por causa das diferenças de fusos. Quando a festa em nosso alojamento acabou partimos para uma outra no alojamento ao lado. Aquela festa estava bem animada com gente de quase todos os continentes, muita música, bebida e diversão. Fomos dormir quase todos bêbados as 2 da manhã. Não é difícil imaginar que acordar as 4 horas para o próximo dia de passeio foi um tanto difícil.

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O Alojamento no deserto

Gastos (em Bolivianos)

  • 3 banheiro (~R$ 1,7)
  • 30 vinho (~R$ 17,64)
  • 15 cerveja (~R$8,8)

Total: 48 bolivianos (~R$ 28,23 na cotação de 1,70).

Dia 30/12, primeiro dia em Uyuni e no salar

Entrei no ônibus e me preparei para a próxima aventura. Bom, para variar a própria viagem de ônibus teve seus ares de aventura. Passamos nos arredores de Potosi, a segunda cidade mais alta do mundo, que acabei desistindo de conhecer conforme explico aqui. O ônibus tinha banheiro e ar condicionado mas o motorista estava exagerando na temperatura. Tinha um sujeito asiático ao meu lado que se abanava com o chapéu a todo momento e parecia estar passando mal de tanto calor. A temperatura estava tão alta que o ar quente queimou a minha mão que estava encostada na janela. No fim, depois de tanta gente reclamar o motorista colocou uma temperatura mais adequada.

Quando estávamos chegando em Uiuny tentei conversar com alguns gringos que estavam no ônibus para fecharmos um grupo para o passeio. Uma moça Francesa disse que “estávamos fodidos” porque não haveria passeio de 3 dias por causa do ano novo. Chegamos em Uiuny as 4:30 da manhã e fomos recebidos por uma senhora Boliviana que nos ofereceu o pacote de 3 dias por 700 bolivianos cada (cerca de 410 reais, não incluí entrada ao parque nacional que custa 150 bolivianos). Não havia mais ninguém oferecendo pacotes por ali e estava muito frio, então não hesitamos e partimos com a senhora que administra a agência “Joyas del Sur“.

Nos juntamos eu, a Francesa (que não me lembro o nome) e um casal formado pelo Alemão Laurin e pela Suiça Eliane e fomos com a senhora para um lugar onde serviam café da manhã. Por lá trocamos várias ideias sobre a viagem, a Francesa estava quase voltando para casa e iria fazer o passeio de 1 dia pelo salar, já o casal (que haviam se conhecido na viagem) iria viajar por mais alguns meses para o Chile e talvez até para o Brasil.

Depois partimos para o mercado, onde resolvemos comprar mantimentos para o passeio no salar. Compramos muita água (importante!), papel higiênico, algumas porcarias para comer e vinho boliviano para a festa do ano novo. Também abasteci meu saquinho de folhas de coca, dado que o salar é bem alto e também porque é um barato.

Bom, Uiuny não tem muito o que fazer. Então voltamos para a agência e conhecemos mais algumas pessoas: um Colombiano, dois Costa-riquenhos chamados Pablo e Daniel e um casal de Argentinos de Córdoba chamados Romina e Oscar. O Colombiano e a Francesa partiram para o passeio de 1 dia, enquanto que eu e os demais partimos para o passeio de 3 dias.

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Rumo ao salar!

Foi então que conhecemos o bem-humorado Ernesto, o motorista Boliviano que nos guiaria no passeio. Quando entramos no carro, uma camionete Toyota, Pablo e Daniel sacaram um Cd da mochila e pediram para Ernesto colocar para tocar. Era Reggae Brasileiro! Natiruts. Primeira surpresa do dia: O Reggae Brasileiro é uma referência para a música na América Central. Vivendo e aprendendo. O problema é que o toca Cd não funcionava, mas tinha pendrive, foi aí que começamos a conhecer o peculiar gosto musical de Ernesto, que ainda vai render umas histórias por aqui.

A primeira parada foi no Cemitério de Trens, um lugar de desova de várias locomotivas alemãs, que eram utilizadas para trazer minério das minas de Potosi. Haviam muitos carros parados e dezenas de turistas tirando fotos freneticamente, fazendo poses em cima das locomotivas.

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Cemitério de Trens

As paradas são rápidas, 20 minutos depois já estávamos partindo rumo a um mercado de artesanato já próximo ao salar. Lá também estava um museu de sal, com algumas estátuas feitas de sal, paredes feitas de sal. Enfim, sal, nosso grande parceiro nesse passeio todo.

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Museu de Sal

Depois fizemos a primeira parada no salar. Aquela imensidão branca à 3.500 metros de altura é algo surpreendente. No horizonte é possível ver ao longe algumas montanhas. O sol é forte, o vento é frio e você se sente muito seco. Na primeira parada todos descemos e começamos a botar em prática nossas ideias de fotos engraçadas. Parecia um grande jardim de infância e isso foi realmente muito legal! Tivemos um pouco de azar porque não havia chovido, então não pudemos apreciar o famoso efeito espelhado que a água causa quando a luz do sol se reflete nela.

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Primeira parada no salar

Paramos para almoçar no primeiro hotel de sal criado dentro do salar (depois de um tempo as leis ambientais proibiram a existência de hotéis no salar e o hotel acabou virando somente um restaurante). O rango era simples e estava bom. O hotel fica ao lado do monumento criado para o Rali Dakar, maior prova de automobilismo do tipo no mundo e que acontece desde 2009 em terras Sul Americanas. O Dakar é incentivado pelo governo Boliviano e impulsionou o turismo na região de Uiuny e também no norte da Argentina. Importante: Durante o Dakar, que acontece nas primeiras semanas de Janeiro, não existem passeios pelo salar.

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Monumento ao Dakar

20151230_134630Antigo Hotel de Sal, hoje um restaurante

A próxima parada no salar foi em uma região onde o solo parecia todo rachado. As rachaduras no sal formavam padrões, como hexágonos e outros polígonos. A surpresa: algumas partes do solo eram extremamente finas e escondiam água no fundo. Curioso, fui logo metendo a mão dentro da água salgada (e gelada!), encontrando cristais de sal bem interessantes! Nessa parada Ernesto nos emprestou Rex, o Dinossauro, que utilizamos para tirar algumas fotos. Ele também nos falou do projeto piloto do governo, que encontrou Lítio nas águas salgadas do salar e que pretende nacionalizar a sua exploração. Lítio é um metal raro, muito utilizado na produção de baterias.

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Rex

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O salar e seus cristais de sal

Seguimos em direção as tais ilhas no meio do salar. A ilha escolhida foi Incahuasi, ou “casa Inca” no idioma queshua. O local, que era ponto de parada dos Incas, é como se fosse uma pequena montanha coberta de cactus e vegetação do deserto em pleno salar. É também um centro turístico, e como cobravam 30 bolivianos para a entrada (cerca de 17 reais), acabei por não entrar e ficar ali por fora batendo umas fotos e brincando com os cachorros que passeavam por perto.

20151230_165936Incahuasi, uma das ilhas no meio do salar

Aquele longo dia estava acabando então paramos para apreciar o por do sol no salar, que diga-se de passagem foi algo muito lindo. Depois partimos em direção ao hotel de sal, que fica bem nos limites do salar. Não preciso dizer que o hotel era todo feito de sal, inclusive a cama. Cansados, descobrimos que a ducha era paga, só podíamos usar por 5 minutos e estava muito frio. Foi então que selamos um pacto salgado: não iriamos tomar banho naquele dia.

A janta estava deliciosa: sopa, batatas e frango assado com arroz. Passamos mais de uma hora conversando sobre politica e a história de nossos países. Foi interessante perceber o quanto temos em comum enquanto latino-americanos: as ditaduras e o plano condor, os governos neoliberais, as mudanças sociais e os limites dos governos populares. Enfim, foi uma longa conversa onde divergências a parte, conseguimos nos reconhecer como irmãos. Cansados, dormimos para recarregar as baterias para o dia seguinte.

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Por do sol no salar

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Nosso quarto no hotel de sal

Dica de o que levar para o  Salar:

 

  • Roupas de frio (moleton, blusa de lã, luvas e capuz).
  • Óculos escuros
  • Protetor solar e manteiga de cacau para os lábios
  • Água, muita água
  • Folhas de coca
  • Papel higiênico

 

Gastos (em Bolivianos)

  • 700 tour de 3 dias (~R$ 411,70 ou ~R$ 137 por dia)
  • 35 café (~R$ 20,50)
  • 75 2 garrafas de vinho (~R$44,11)
  • 25 água de 5l, papel higiênico, balas e bolachas  (~R$ 14,70)
  • 3 banheiro (~R$ 1,76)
  • 5 folhas de coca (R$ 2,94)

Total: 843 bolivianos (~R$ 496 na cotação de 1,70).